Caminhos para reconstruir as políticas públicas de alimentação

Nos últimos anos, milhões de brasileiras e brasileiros passaram a conviver com a fome ou com algum grau de insegurança alimentar, como denunciaram os Inquéritos da Insegurança Alimentar da Rede PENSSAN. Em 2022, mais de 33 milhões se encontravam nesta situação – uma realidade vergonhosa, que expõe violações ao direito constitucional à alimentação da população brasileira.  Além da privação de acesso aos alimentos, há que se considerar que situações de insegurança alimentar comprometem fortemente a alimentação adequada e saudável, sendo este um determinante para a alta morbimortalidade por doenças crônicas não transmissíveis.

Com a eleição de um novo governo, é oportuno somar esforços para superar o flagelo da fome, denunciado desde os anos 40 por Josué de Castro e tão presente 80 anos depois. Diante deste cenário político, nós, da rede PENSSAN, destacamos os pontos que consideramos essenciais para fazer avançar a pauta de promoção da segurança alimentar e nutricional para todos.
O primeiro ponto se refere a compreender os processos históricos geradores da fome e insegurança alimentar no Brasil. É importante destacar que o cenário atual não é apenas consequência da pandemia, mas sim reflete o tratamento político secundário dado às questões sociais no país, consoante ao modelo de desenvolvimento que se fez hegemônico. O aumento da prevalência da insegurança alimentar no Brasil é um problema nacional, no entanto se mostra mais sensível nas regiões norte e nordeste – e nos domicílios rurais, como denunciam os Inquéritos da rede. Além disso, existe um recorte de gênero e raça: mulheres da cor/raça preta ou parda são mais vulneráveis a situações mais severas de privação da alimentação.
O cenário de fome e insegurança alimentar generalizada resulta de forma direta do desmonte do Estado brasileiro, a partir de 2016, com  a  desarticulação de arranjos institucionais, de políticas públicas  e de programas sociais fundamentais para redução da fome. É urgente retomar e fortalecer estruturas como o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA) e o Programa de Transferência de Renda conhecido como Bolsa Família.. Além disso, é preciso recriar o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e reajustar o orçamento necessário ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), dentre outros.
Além de fortalecer esses e outros mecanismos, estruturantes para a superação das crises sistêmicas e redução da pobreza e fome no Brasil, é preciso investir em pesquisa para conhecer nossa realidade. O combate à fome exige produção, sistematização e disseminação de dados, censos, inquéritos, que orientem a ação pública e os movimentos sociais. Além do fomento científico, devem ser fortalecidas instituições como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que gera informações riquíssimas sobre as nossas diversidades regionais, étnicas, raciais e de gênero – nossa diversidade de ocupação do território brasileiro.
Diante do que vivemos nos últimos anos, temos um enorme déficit democrático a ser superado – na ausência de uma prioridade governamental e de espaço de participação efetivo da sociedade civil no governo, milhões de brasileiros tiveram seu direito à alimentação negado. Agora, um novo governo traz esperanças e desafios. Nós, como Rede PENSSAN, continuamos atentos e abertos ao diálogo com aqueles que desejam reduzir efetivamente o cenário da fome no país.

organicsnewsbrasil

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